Somos todos tolerantes?
No uso cotidiano é possível entender o sentido da palavra de um modo propositivo e como que tentando contribuir na tentativa de viver em comunidade de um modo não arbitrário, mas também é possível perceber um tom de voz que sugere arrogância e manifestação de poder. Em filosofia política a palavra tem uma história. Não se preocupe, não vou contar toda a história. Locke se preguntava se era possível ser tolerante com os não cristãos. É claro que a resposta devia ser evidente. Kant escreve e se manifesta contra a palavra. Ele entende que afirmar o enunciado da tolerância supõe um poder superior em relação com o outro e a outorga de um direito que poderia ser eliminado segundo capricho subjetivo. Numa sociedade cosmopolita não há tolerância porque não há o que tolerar, se trata apenas de reconhecer o semelhante não apenas como meio, mas como um fim em si mesmo como sendo a própria humanidade. Tolerar uma ação do outro, tanto do foro íntimo quanto na ação externa explicitamente legislada não diz respeito do que poderia ou não admitir um cidadão ou um sujeito de direito. Acredito que o enunciado da globo tenta manifestar uma posição enfática de algo que é moralmente inadmissível para a instituição. Com boa vontade poderíamos entender que se trata de destacar uma regra moral enfaticamente diante de uma atualidade que mostra pessoas e instituições permissivas em relação com esse ato. Entretanto, todo enunciado prático (por oposição a teórico ou cognitivo, que refere a uma realidade independente) isto é, ético ou político, sempre supõe um sujeito que enuncia. Assim, o sentido do enunciado não está isolado e não é independente dos atos do sujeito da enunciação. Por exemplo, o caso do corrupto que participa de uma manifestação contra a corrupção e diz que desviar dinheiro público é um mal moral. O sentido desse enunciado não pode ser entendido sem o sujeito que o enuncia. No caso, não se trata apenas de um enunciado verdadeiro, mas de um ato cínico, ou mentiroso, ou hipócrita.
Comentários
Postar um comentário